quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Antes do juízo, a evangelização ( Apocalipse 14.6,7)



Os primeiros cinco versículos deste capítulo 14 do livro de apocalipse mostram a maravilhosa situação dos redimidos no céu, diante do trono, louvando o que nele está sentado e ao Cordeiro. Cântico exclusivo dos redimidos, “comprados da terra” e que tem o selo de Deus na fronte. Essa música forte (como muitas águas, trovão), entoada por todos os santos de todos os tempos e todos os lugares. Ao mesmo tempo esse louvor é suave, harmonioso (como os harpistas quando tangem as suas harpas). Essa é a realidade celeste quando o número dos redimidos for completado.  Antes disso, porém, como relatam os versículos 6 e 7, o “evangelho eterno” é pregado. Trata-se das boas novas de vitória para todos aqueles que, arrependendo-se dos seus pecados, confiam inteiramente da graça de Deus em Cristo, o Cordeiro, comprometendo-se inteiramente como seus verdadeiros adoradores. Estes estarão entre os “cento e quarenta e quatro mil” (número simbólico dos redimidos, como vimos no estudo anterior) que adorarão eternamente ao Senhor nos céus. Quem habita a casa de Deus agora, habitará nela eternamente.  Esse anjo (mensageiro) que voa “pelo meio do céu’ representa os mensageiros de Deus, que conclamam os homens ao arrependimento e á fé salvadora.
            A quem é pregado o Evangelho? “Aos que se assentam sobre a terra”. William Hendriksen, no seu livro “Mais que Vencedores”, afirma que essa expressão indica o comportamento dos ouvintes da pregação. Muitos estão displicentes “assentados sobre a terra”, alheios às maravilhas reservadas aos que servem a Deus e, por outro lado, a terrível situação dos que permanecem na indiferença, no pecado. Esse detalhe nos faz lembrar a expressão do profeta Sofonias referente aos que sucumbirão diante do justo juiz: “não buscam a Deus, nem perguntam com ele” (Sofonias 1.6). Essa realidade é também anunciada pelo próprio Senhor Jesus quando compara os ouvintes do Evangelho aos contemporâneos de Noé ( Lucas 17.26-37) que levavam a vida sem se importar com o juízo anunciado e só se deram conta da sua seriedade quando já era tarde demais: a porta da arca já havia sido fechada. Pereceram no dilúvio.  Essa é a advertência que devemos fazer aos que se encontram tranqüilamente “assentados”, desatentos quanto às suas necessidades espirituais. Devemos alertá-los: o juízo de Deus está próximo e só Jesus pode nos livrar da ira vindoura (1 Tessalonicenses 1.10).
Esse “evangelho eterno” é pregado “a cada nação, e tribo, e língua, e povo”. Bendito seja Deus que, segundo a sua infinita graça, escolheu para si pessoas de todo mundo. Ele cumpriu a promessa feita a Abraão (Genesis 12. 3). A proclamação é universal (Mateus 28.18-20; Atos 1.8). No final, Deus será glorificado com a salvação do seu povo de todos os lugares (Apocalipse 5.9). É certo também, pelo ensino de toda a Escritura, que muitos daqueles que ouvirão o Evangelho permanecerão desapercebidos “assentados”, sendo surpreendidos pelo juízo de Deus. O grande desafio é que sejamos mensageiros obedientes, anunciando a Palavra a todos os povos. Para isso devemos nos envolver com as missões mundiais. Podemos ser instrumentos de evangelização aos de perto e aos de longe. Oração, apoio aos mensageiros de Deus, contribuição financeira e anúncio pessoal são  formas que temos para evangelizar o mundo.
Qual é o conteúdo do Evangelho a ser pregado? “Temei a Deus e dai-lhe glória”. Os mensageiros fiéis convocam os homens ao temor do Senhor que é o princípio da sabedoria (Provérbios 1.7). É nesse temor, respeito profundo por Deus, por sua santa vontade revelada nas Escrituras, que encontramos a sabedoria suprema. Aquela que é útil para a vida presente, mas também para a eternidade (2 Timóteo 3.14-17). Com esse chamado, procuramos despertar os que estão “assentados”, displicentes, para que acordem para a grandeza de Deus e para o nosso dever de respeitá-lo como nosso Senhor (Salmo 24.1; 100.3; Romanos 11.36). “Qual o fim principal do homem? O fim principal do homem é glorificar a Deus e gozá-lo para sempre” (Breve Catecismo de Westminster, pergunta/resposta nº. 1). Ao evangelizar, a Igreja chama o pecador ao arrependimento para que volte-se para a finalidade principal da sua existência: “Temei a Deus e dai-lhe glória”.
Evangelizar é recrutar adoradores para Deus (João 4.24). Por isso mesmo devemos ser zelosos quanto ao ato de adorar, pois se ajuntamos os pecadores arrependidos e não os conduzimos à adoração nos moldes estabelecidos por Deus, na sua Palavra, a nossa obra não será completa. Pior, poderá ser até ofensiva, deturpadora da ordem celeste. Apocalipse 14.7 completa: “adorai aquele que fez o céu, e a terra, e o mar, e as fontes das águas”. Essa ordem evangélica pressupõe a rejeição a qualquer outro objeto de adoração que não seja o Criador dos céus e da terra. É demonstrada aos leitores originais do Apocalipse, a impertinência da adoração ao imperador de Roma. Fica demonstrado a todos os cristãos de todas as épocas que os homens devem ser alertados quanto a todo falso culto (para que não levem na mão e na fronte a marca da besta que emerge da terra, cf. Apocalipse 13. 11-18). Há um só Deus, o Deus vivo e verdadeiro, criador dos céus e da terra. Só ele é digno da nossa adoração. Adorar outros deuses provoca a sua ira (Sofonias 1.1-5), mas simplesmente deixar de adorá-lo também é causa do seu juízo (Sofonias 1.6).
Na nossa mensagem evangelística não pode faltar a advertência: “pois é chagada a hora do seu juízo” (Apocalipse 14.7). O dia do juízo será um dia de alegria (boa notícia!), mas também um dia de terror (Malaquias 3.13-4.6). Alegria para os redimidos que se apresentarão diante do trono e do Cordeiro. Terror para os que permaneceram distante de Deus, indiferentes, desrespeitosos, vivendo segundo as suas própria inclinações e pensamentos. Portanto, atendamos todos ao chamado do Evangelho e sejamos adoradores dedicados, reverentes, reconhecendo o poder do Criador e sustentador de todas as coisas (Romanos 1.18-25)!
Que a graça do Senhor seja sobre nós!


(Estudo bíblico ministrado pelo Rev. José Normando Gonçalves Meira no dia 24.11.2011(Quinta-feira) na Congregação Presbiteriana do Bairro de Lourdes, em Montes Claros - MG, como parte da exposição do livro do Apocalipse).

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

O Governo dos Anciãos

João Calvino, ao discutir sobre os sistemas de governo, afirma: “(...)em virtude dos vícios ou defeitos dos homens, é mais seguro e mais tolerável quando diversos exerçam o governo, de sorte que, assim se assistam mutuamente, ensinem e exortem uns aos outros; e, se alguém se exalta mais do que lhe é justo ,muitos sejam censores e mestres para coibir-se seu desregramento” (Livro IV, Capítulo XX das Institutas). Exalta as vantagens da aristocracia, tendo como um dos principais argumentos o governo dos anciãos na Bíblia desde os tempos de Moisés. O nosso Sistema Presbiteriano segue esse princípio. A nossa Igreja é conciliar. Nela não há espaço para decisões unilaterais, centralização. Os presbíteros reunidos em conselho, com temor e oração, tomam as decisões para a edificação da Igreja. É possível que os concílios errem? A nossa Confissão de Fé, fiel à Bíblia, reconhecendo que  Deus é o único infalível, responde que sim e acrescenta que "muitos têm errado" (Cap. XXXI,III). Quando, porém, o governo da Igreja é entregue a um homem só, nos moldes da monarquia, a possibilidade de erro é muito maior. Se é entregue ao povo como um todo, é possível (provável) que nem todos tenham maturidade suficiente para governar. Além dos grandes desafios doutrinários que temos  em busca da pureza da Igreja, inclusive no que concerne à  liturgia, em busca do culto teocêntrico,  devemos também preservar o nosso governo bíblico, sadio, prudente. No Sistema Presbiteriano a Igreja não é do "pastor fulano", não é o pastor quem decide sozinho, quem aceita ou deixa de aceitar. As resoluções são tomadas coletivamente, em colegiado. Afinal, o pastor é presbítero e os presbíteros também são pastores do rebanho. Onde há o personalismo centralizador dos dominadores do rebanho é porque o sistema já foi adulterado. Onde ele é fielmente aplicado, se a decisão foi acertada, glorificamos a Deus em conjunto, pois o concílio foi instrumento de Deus naquele acerto. Se houve erro, assumimos a responsabilidade em conjunto, pedimos perdão a Deus e lutamos contra a reincidência. Louvemos a Deus pelo nosso sistema de governo e oremos e labutemos para que ele permaneça fiel. Amém!

Os objetivos do ensino da História




Qual a relevância social do conhecimento histórico?  Entendendo a história como “estudo do passado” (Borges, 1993, p.56) e que esse passado é único, não se repete, surge a pergunta, qual a utilidade do estudo dessa disciplina? Essas perguntas revelam um determinado conceito de história e historiografia, presas aos “acontecimentos passados”. Apontam também para a  necessidade de se aclarar o  entendimento sobre a natureza, objetivos e métodos  da produção desse conhecimento. Para que estudar história? Borges (1993, p.8) reconhece que “o passado visto por si mesmo, o passado pelo passado, tem um interesse muito limitado, quase nulo”. O objetivo da história, porém, vai muito além da mera pretensão de narrar o passado, tornando-o conhecido. Ao reconhecer a impossibilidade de objetividade plena, pretende-se explicá-lo, possibilitando uma reflexão sobre a realidade e, a partir dessa análise, transformá-la. Reis (1999, p. 8) afirma: “O passado é uma referência de realidade, sem a qual o presente é pura irreflexão”. Estudar, analisar, interpretar o que passou, possibilita, portanto uma ação consciente sobre a realidade vivida, identificando os processos de sua construção.  É grande o potencial da disciplina história, como das demais ligadas à filosofia e às ciências humanas. Evidência disso é a ação preventiva de governos autoritários suprimindo ou ajustando essas disciplinas aos seus interesses. O ato reflexivo, autonomia intelectual, a análise crítica da realidade, representam “perigo” nesses contextos, pois conduzem à resistência, à ação transformadora. Podemos citar como exemplo na história recente do Brasil, o status dessas disciplinas durante o regime militar.
            O ensino de história, como das disciplinas escolares em geral, servem a objetivos estabelecidos pelo Estado.  Sendo esses objetivos flexíveis, elaborados em um contexto democrático, ou rígidos para servir aos interesses autoritários, exigem uma postura crítica por parte dos educadores, despertando os seus alunos para  aprofundarem na  leitura, inclusive dos manuais didáticos. Os professores, mediadores da produção desse conhecimento, devem ser motivadores da autonomia intelectual mesmo quando  a proposta oficial aponta em outra direção. Aqui que a escola, “reprodutora” da ordem estabelecida, “aparelho ideológico do Estado”, funciona também como propulsora da transformação. Em contextos autoritários, os educadores podem (devem) ser agentes de resistência. Daí o “cuidado” que esses governos tem, especialmente com a história e outras disciplinas relacionadas às ciências humanas.
            Diversos estudos de cunho historiográficos tem se ocupado do ensino de história em geral e, especificamente no Brasil. Discutem os diversos momentos da história da educação brasileira com as suas concepções e objetivos da própria prática educativa e, consequentemente, a postura pedagógica neles produzidas.  Apontam as mudanças ocorridas a partir do início da década de 80  com o processo de redemocratização do país e a culminância das propostas voltadas para o paradigma da “Nova História”[2] nas LDBEN de 1996 e os Parâmetros Curriculares Nacionais a ela subordinados. Manoel (S/D, p. 163) resume:
Dos meados do século XIX até a Proclamação da República, o projeto consignado ao ensino da História era preparar as classes possuidoras em geral, e os nobres em particular, para o exercício do poder e para a direção da sociedade. Das primeiras reformas republicanas até a década de 1980, propunha-se formar o cidadão, dando-lhe a consciência de pertencer a uma nação que se consolidava conforme os ideais da liberal democracia e que deveria empregar todos os seus esforços para sua manutenção e para o desenvolvimento científico, tecnológico e industrial, de modo a se por no mesmo nível das nações já desenvolvidas. Da década de 1980 em diante, passou-se a questionar o sentido da palavra consciência e se enveredou pelo caminho do debate político do significado do ensino da História no contexto de uma sociedade que estava lutando para se redemocratizar.
           
            Concordando que as questões relacionadas ao currículo escolar não são neutras, mas historicamente estabelecidas, não há dúvidas de que os objetivos do ensino de história estarão relacionados com a proposta de cidadão e sociedade  elaborada de acordo com os diversos contextos. Até para a análise da prática pedagógica referente a essa e a outras disciplinas, é necessária contínua vigilância quanto às posturas anacrônicas. Educadores e pesquisadores devem enfrentar o desafiador exercício de analisarem o passado, levando em consideração a mentalidade, crenças e valores do período em que estão estudando.
No nosso caso, levaremos em conta as abordagens propostas a partir dos anos 80 e 90 que atingiram o status de proposta oficial, os Parâmetros Curriculares Nacionais. Um importante estudo realizado por uma equipe de professoras da PUC-SP (Borges, 1998) permite verificar  com clareza o processo de encaminhamento das questões em debate nesse período. A primeira edição da obra é de 1986 e muitas das propostas nela apresentadas representavam novidade naquele momento. Na edição de 2000 as autoras reconhecem o avanço das discussões e muitas das reivindicações e termos utilizados na primeira edição se tornaram parte de programas oficiais, especialmente  em São Paulo  no Paraná. Os pressupostos filosóficos da referida obra estão presentes de forma marcante nos próprios Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino de História.
  Nessa perspectiva, reafirma-se que os próprios documentos oficiais estão sujeitos à crítica, e não devem ser apreendidos como modelos rígidos. Para que haja uma leitura adequada, relevante, desses documentos e dos livros didáticos, capaz de constatar lacunas e apresentar alternativas de interpretação, é necessário embasamento teórico por parte dos educadores. O papel do livro didático, a sua relevância e cuidados necessários para a sua correta utilização, bem como a formação de professores em geral e, especificamente par ao ensino de história, constituem campos férteis de investigação. A consciência do caráter político da educação, proposta por Paulo Freire, é fundamental para a prática pedagógica nessa perspectiva. Os educadores não devem apenas servir de forma ingênua aos objetivos pré-estabelecidos. Devem ter a formação necessária que possibilite analisá-los, para o prévio preparo das suas atividades docentes e com os alunos  em sala de aula. Um ponto que, logo de início, deve ser objeto de discussão está relacionado às condições pedagógicas e materiais para que esse ideal seja atingido (cf.Borges 1999, p. 9). As questões relacionadas à qualidade do ensino não devem ser reduzidas ao espaço escolar, à relação professor-aluno. O problema é mais abrangente. Deve-se levar em consideração  a origem social dos professores, as condições em que foram formados e às condições de trabalho que são submetidos.  Da mesma forma, os alunos e o contexto em que vivem. Não se trata apenas de ter escolas bem construídas e bem equipadas, embora seja este um aspecto importante para o cumprimento dos objetivos propostos para a educação básica. Se, de acordo com os PCN, um dos objetivos do ensino de história é “identificar o próprio grupo de convívio e as relações que estabelecem com outros tempos e espaços”, é possível se utilizar do próprio estudo da disciplina para refletir sobre essas questões. Em que medida essa realidade vivida e que se reflete na escola, relaciona-se com o passado estudado?
Como temos proposto ao longo deste texto introdutório, a leitura crítica é característica fundamental da academia, do espírito científico. É a partir do questionamento que a ciência prossegue no seu caráter dinâmico. Nessa perspectiva, toda leitura deve ser crítica. Devemos avaliar quem escreveu, o seu contexto, objetivos, fundamentação teórica, fontes e métodos. Não se trata de suspeita maldosa, superficial, exagerada, o mito da conspiração, aquela idéia de que sempre há uma intenção de manipular e tirar proveitos pessoais, políticos ou econômicos. Trata-se da consciência de que a toda produção humana é parcial, parte de um determinado lugar e se direciona de acordo com crenças e valores dos autores. O PCN, portanto, deve ser objeto dessa análise. Sem aprofundar nas complexas questões referentes aos conteúdos neles propostos[3]  ressaltamos, como afirma Cabrini et all (2000, p.14):
(...) a idéia fundamental neles presente é, segundo expressam, integrar o ensino ao cotidiano do aluno, objetivando a educação para a cidadania, colocando a escola em consonância com as demandas atuais da sociedade. A tônica marcante é investir na perspectiva de uma mudança de mentalidade quanto ao ensino-aprendizagem. Os PCN expressam sobretudo as reflexões no campo da produção do conhecimento em geral e das diversas áreas do conhecimento, assim como dos estudos pedagógicos. Traduzem propostas de redefinição de princípios, objetivos, conceitos, conteúdos e métodos, como repensar noções de tempo, espaço, memória e história.
Ter como objetivo produzir conhecimentos e não apenas a sua transmissão por parte do professor que, por sua vez, os recebe pronto nos livros didáticos, é fundamental para que sejam cumpridos os objetivos propostos para a educação básica em geral e, especificamente, para o ensino de história. “Conhecer e respeitar o modo de vida de diferentes grupos sociais, em diversos tempos e espaços, em suas manifestações culturais, econômicas, políticas e sociais, reconhecendo semelhanças e diferenças entre eles” (BRASIL, 1997. p.13 )  torna-se possível a partir do manuseio de diversos tipos de documentos, um diálogo com eles, mediado pela ação do professor, e não apenas por meio de leituras das suas interpretações, embora estas sejam também imprescindíveis. O mesmo pode ser dito em relação a  “reconhecer mudanças e permanências nas vivências humanas, presentes na sua realidade e em outras comunidades, próximas ou distantes no tempo e no espaço”.  A superação da prática docente como apenas reprodutora do conhecimento produzido por especialistas e, ao mesmo tempo, da dicotomia entre ensino e pesquisa é proposta por Cabrini (2000, p.15):
Na maioria dos casos, as propostas que buscam integrar ensino e pesquisa não tem logrado superar essa dicotomia por não conseguirem pensar o ensino como pesquisa. Propomos hoje mais um desafio: pensar não a mera articulação entre ensino e pesquisa, mas o próprio ensino como pesquisa. Nessa direção, a pesquisa não é uma atividade a mais, é o princípio norteador de toda atividade na sala de aula. Nossa proposta implica o papel ativo de professores e alunos, que terão autonomia na busca de momentos e lugares significativos de sua experiência social de indivíduos e grupos sociais a partir de suas próprias referências.
A leitura de textos de história, do próprio livro didático como apoio, e a  relação do aluno com fontes primárias (sobre fontes históricas discutiremos mais adiante, em texto específico)  é o “tratamento capaz de situar a relação entre o particular e o geral, quer se trate do indivíduo, sua ação e seu papel na sua localidade e cultura, quer se trate das relações entre a localidade específica, a sociedade nacional e o mundo” (PCN,  ).  A disciplina história trabalhada nessa perspectiva visa a reflexão sobre a identidade do aluno, do grupo a que pertence, articulada com a sociedade em geral.  O aluno é visto como sujeito histórico e não como mero coadjuvante na história produzida por grandes homens. Estão presentes aqui o que Peter Burke (1993) refere-se, mesmo reconhecendo as dificuldades da expressão, à “história vista de baixo”. A superação do paradigma tradicional que atribui aos grandes políticos, generais, a construção da história. São “homens que tem história”. Esse pressuposto da nova história chega à sala de aula quando professores e alunos, por meio da produção do conhecimento por meio da pesquisa, refletem, a sua condição de agentes, ativos na construção da realidade histórica. Nesse caminho, começa a se perceber com clareza a relação entre ensino de história e cidadania, ampliando a concepção de “homens livres e iguais” em comparação com esse entendimento em outros tempos e lugares.
O ensino de história, como as disciplinas escolares em geral, é marcado por escolhas políticas. Que tipo de cidadão o sistema  escolar pretende formar? Essa questão geral norteia os objetivos e os métodos e todas as demais questões curriculares. No caso da disciplina história é possível observar em diferentes momentos o enfoque sobre a identidade nacional, logo após à proclamação da república e conteúdos voltados para o amor á ordem nacional e o medo da invasão comunista, durante o estado novo e no regime  militar e, nesse processo de redemocratização, a ênfase no cidadão crítico, capaz de interpretar as experiências vividas pelo país e posicionar-se como construtor do futuro. Martins (2008, p. ) afirma:
Desde a publicação dos PCNs, temas como ética e pluralidade cultural passaram a permear o ensino da disciplina, indicando mais uma mudança: se nos tempos idos o objetivo era fomentar a idéia de identidade nacional, ancorada na deturpação e romantização de acontecimentos, hoje o intuito é explorar as diferentes identidades que existem dentro de uma nação, tornando os alunos sabedores da diversidade cultural de sua época. Um desafio e tanto para os professores.

 Dirigindo-nos para as considerações finais dessa discussão introdutória sobre os objetivos do ensino de história, consideremos o que pondera  Araújo (2006):
O ensino de História no Ensino Fundamental, e também no Ensino Médio, tem como objetivo fundamental proporcionar a nossos(as) alunos(as) as condições para que eles(as) consigam se identificar enquanto sujeitos históricos, participando de um grupo social, ao mesmo tempo único e diverso. Talvez este seja o nosso maior desafio, como professores: ensinar primeiramente a pensar, criticar, propor! Despertar em nossos estudantes o desejo de conhecer, de participar ativamente da sociedade em que vivem de forma crítica, reflexiva e transformadora. Mais essencial do que ensinar conteúdos específicos, que também são importantes, o ensino de História na Educação Básica possui o sentido maior de construção do cidadão crítico, que tenha a capacidade de participar ativamente da sociedade em que vive e de se indignar com os acontecimentos do cotidiano. Assim sendo, o objetivo do ensino de História é compreender mudanças e permanências, continuidades e descontinuidades, para que o aluno aprenda a captar e valorizar a diversidade e participe de forma mais crítica da construção da História. Faz parte, então, do procedimento histórico a preocupação com a construção, a historicidade dos conceitos e a contextualização temporal.
            A disciplina história, portanto, é campo fértil para uma ação relevante por parte de educadores que desejam eficácia na formação de cidadãos autônomos. A valorização das marcas deixadas pelos homens e que permitem uma interpretação dos seus atos cotidianos que possibilitaram a construção da sociedade da sua época e os efeitos produzidos nas sociedades que os sucederam. As suas lutas e o que, a partir delas, foi conquistado. Qual a relação entre esses embates sociais dos períodos estudados com os do presente? O que podemos aprender ao refletir sobre aquelas realidades vividas?  Quais as transformações devem ser consideradas nessa análise e, portanto, como podemos aprender com o passado sem perder de vista as peculiaridades dos desafios atuais? Todo esse exercício deve ser feito com a consciência de que não se deve emitir juízo de valores, desconsiderando as mentalidades próprias dos períodos estudados e observando-os com os óculos do presente.


REFERÊNCIAS

ARAÚJO, Maria Helena Marques. Usos do Passado. IN: http://www.rj.anpuh.org/resources/rj/Anais/2006/conferencias/Helena%20Maria%20Marques%20Araujo.pdf Consta em : 05.10.2011
BORGES, Vavy Pacheco. ET all. O Ensino de História: revisão urgente. São Paulo> Brasiliense, 1998
BORGES, Vavy Pacheco. O Que é História. 2. Ed. São Paulo: Brasiliense, 1993
BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília/SEE, 1997
BURKE, Peter (Org.). A Escrita da História: Novas Perspectivas. São Paulo: UNESP, 1992
CALLAI, Jaeme Luiz. História da vida, história da família nas séries iniciais, uma introdução à forma de pensar a história. Espaços da Escola. Ano IV, n. 15, jan/mar. Editora Unijuí, 1995
MARTINS, Ana Rita. Passado e presente, juntos para ensinar. IN: http://www.controversia.com.br/blog/?p=9734. Consta em: 05.10.2011
PENTEADO, Heloisa D. Metodologia do Ensino da História e da Geografia. São Paulo: Cortez, 200
PINSKY, Jaime (Org.). O Ensino de História e a Criação do Fato. São Paulo: Contexto, 2001
REIS, José Carlos. As Identidades do Brasil: De Varnehagen a FHC. 2. Ed. Rio de Janeiro: FGV,1999


[1] Texto publicado no caderno “Fundamentos e Metodologia da História” da Universidade Aberta do Brasil (UNIMONTES, 2010)
[2] Sobre o conceito de “Nova História”, suas origens, vantagens, limitações e contrastes com o paradigma tradicional, ver BURKE  1993, p.7 - 37
[3] Essas questões ficaram abertas, como indicaremos ao final do texto, para um exercício de interpretação por parte dos próprios alunos

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Conversa Franca - Primeiro Mandamento


O programa Conversa Franca é transmitido pela Rádio Terra AM 760 Khz de Montes Claros, Minas Gerais, todo domingo, às 11h30. Você também pode ouvir pela internet no site www.radioterraam.com.br.

Conversa Franca - Dez Mandamentos (1)


O programa Conversa Franca é transmitido pela Rádio Terra AM 760 Khz de Montes Claros, Minas Gerais, todo domingo, às 11h30. Você também pode ouvir pela internet no site www.radioterraam.com.br.

Conversa Franca - "A Redenção da Alegria"


Programa da Congregação Presbiteriana do Bairro de Lourdes em Montes Claros - MG - Dia 06.03.2011. O programa é apresentado aos domingos de 11h30min às 12h na Rádio Terra AM 760 Khz e pode também ser ouvido pela internet; www.radioterraam.com.br

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Fé Cristã e Conhecimento Científico

A fé cristã é incompatível com o conhecimento científico e as elaborações racionais? É difícil responder objetivamente a esta pergunta devido à variedade de segmentos abrigados pelo que é denominado “fé cristã”. Discutirei de forma sucinta e introdutória aqui alguns princípios relacionados à fé cristã da tradição reformada e sua relação com a ciência. São vários historiadores e sociólogos que discutem as transformações sociais influenciadas pelas convicções religiosas oriundas da Reforma Protestante do Século XVI. Max Weber é referência para grande parte dessas análises. Ele constata um elemento na fé protestante em geral e, especialmente na vertente calvinista, que seria o gerador de todas essas ações transformadoras. É o que ele chama de “ascetismo intramundano”. O que isto significa? Segundo o sociólogo alemão, o protestantismo, em comum com o catolicismo romano e outros segmentos religiosos, nega o mundo. A diferença é que essa negação do mundo, no protestantismo, em vez de sair do mundo, propõe-se a enfrentar o mundo com o propósito de transformá-lo para a glória de Deus. Esse conceito serve para entendermos a ação do protestantismo em diversos campos, inclusive no que diz respeito à investigação científica.
Considerando que o objetivo da ciência é “conhecer a realidade” para promover a felicidade humana, então o cristianismo, do ponto de vista bíblico, reformado, entende que a “ciência é de Deus” e precisa ser desenvolvida. Afinal, nesta perspectiva, Deus criou o homem e um dos aspectos da imagem e semelhança de Deus no homem é a capacidade de conhecer a realidade que o cerca. A “ciência” nesse sentido amplo é inerente à natureza humana. Desde os primeiros anos da sua existência o homem já revela o seu desejo (e necessidade) de conhecer. Aquelas inquietantes perguntas com as quais os pequerruchos transtornam pais e professores servem de exemplo. Deus  detém o conhecimento absoluto e outorgou ao homem, sua imagem e semelhança, uma amostra dessa inteligência. Capacidade de conhecer. É dever do homem, portanto, desenvolver esse potencial em submissão ao Criador. Acomodar-se na ignorância é negligenciar o dom recebido. Esse é um principio bíblico enfatizado pelo cristianismo reformado. Eis a razão da ênfase do protestantismo na educação escolar. São muitas as instituições de ensino, nos diversos níveis, criadas pela igreja protestante para alcançar com a expansão do conhecimento, as sociedades nas quais esse segmento cristão se instalou. No Brasil, são diversas as dissertações de mestrado e teses de doutoramento que estudam práticas educativas, projetos educacionais e a fundação de instituições de ensino por parte dos protestantes que aqui chegaram definitivamente em meados do Século XIX. Desde as chamadas escolas paroquiais, com objetivos relacionados à alfabetização, aos grandes colégios, às escolas para formação de profissionais até às grandes universidades,  nas diversas regiões do país.
A relação entre ciência e fé é complexa e este não seria o espaço adequado (e suficiente) para tratá-lo com o rigor.  Nosso objetivo aqui é apenas sinalizar, estimular a leitura sobre o tema, desmitificando aquela atribuição apressada de obscurantismo à fé cristã. A falsa idéia de que todos os segmentos cristãos, em todos os contextos, evitassem a pesquisa, a investigação, refletindo um receio pela “descoberta da verdade”. O segmento supra-mencionado, firmando-se na convicção de que “toda verdade procede de Deus”, incentiva a sua busca, considerando os princípios éticos extraídos da Bíblia. Conflitos com certas teorias científicas são inevitáveis. Esses conflitos, entretanto, existem até entre as próprias teorias científicas em seu dinâmico e intenso debate. 

 
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